1. INTRODUÇÃO
Controle da constitucionalidade é a verificação da adequação vertical que deve existir entre as normas infraconstitucionaise a Constituição. E sempre um exame comparativo entre um ato legislativo ou normativo e a Constituição. Todo ato legislativo ou normativo que contrariar a Lei Fundamental de organização do Estado deve ser declarado inconstitucional.
2. FUNDAMENTO
O
fundamento do controle da constitucionalidade encontra-se na idéia de
supremacia da Constituição escrita, da existência de uma lei maior que
se sobrepõe a todas as demais normas jurídicas existentes no País. A
supremacia decorre da própria rigidez das Constituições escritas. Por
exigir a norma constitucional um procedimento especial de alteração mais
rigoroso que o das normas infraconstitucionais, todos os demais atos
legislativos e administrativos são hierarquicamente inferiores.O que
estiver em desacordo com a Constituição, vértice de todo o sistema
jurídico, deve ser declarado inconstitucional. Dois pressupostos são
indispensáveis para que o controle de constitucionalidade seja exercido:
1°) a presença de uma Constituição rígida, da qual resulte a superioridade das normas constitucionais sobre as demais; e
2°) existência de um órgão que efetivamente assegure a supremacia do texto constitucional.
3. ORIGENS DO CONTROLE DA CONSTITUCIONALIDADE
O
mecanismo de verificação da constitucionalidade das normas
infraconstitucionais pelo Poder Judiciário é uma construção do
constitucionalismo norte-americano. Diversos precedentes judiciais
levaram ao mecanismo de verificação judicial da adequação vertical das
leis com o Texto Constitucional, até a eclosão do famoso case Marbury
versus Madison, relatado pelo Presidente da Suprema Corte norteamericana
John Marshall em 1803. Essa doutrina do controle da constitucionalidade
das leis pelo Poder Judiciário como uma decorrência inevitável da
superioridade da Constituição escrita em relação às demais normas
consolidou-se na jurisprudência norteamericana. O Brasil, influenciado
por esse modelo, passou a admitir o controle judicial da
constitucionalidade a partir da primeira Constituição Republicana, em
1891.Por sua ver, na Europa, a partir do século X, com fundamento nas
idéias de Kelsen, desenvolveu-se um outro modelo para assegurar a
supremacia das normas constitucionais. Foi instituído o controle de
constitucionalidade em abstrato, exercido por um órgão não pertencente
ao Poder Judiciário, um Tribunal ou uma Corte Constitucional, examinando
a lei em tese e com efeitos e erga omnes. No Brasil, essa forma de
controle foi definitivamente introduzida em 1965, com a Emenda
Constitucional n. 16 à Constituição de 1946. A Constituição de 1934
jácontinha a possibilidade de representação interventiva por iniciativa
do Procurador-Geral da República perante o Supremo Tribunal Federal.
4. ESQUEMA Inconstitucionalidade:
- por ação: formal e material - por omissão
- Formas de controle: preventivo e repressivo
- Órgão de controle: político e judiciário
- Critérios de controle: difuso e concentrado
- Meios de controle: incidental e principal
- Efeitos da decisão: inter partes e erga omnes
- Retroatividade: ex tunc e ex nunc
5. FORMAS DE INCONSTITUCIONALIDADE
Inconstitucionalidade
é a incompatibilidade entre um ato legislativo ou administrativo e a
Constituição Federal. Existem duas formas de inconstitucionalidade: por
ação e por omissão.
5.1. INCONSTITUCIONALIDADE POR AÇÃO
É a
produção de atos legislativos ou normativos que contrariem dispositivos
constitucionais. A inconstitucionalidade pode ser por motivos formais ou
materiais. A primeira ocorre quando o ato é produzido por autoridade
incompetente ou em desacordo com as formalidades legais, como prazos,
ritos etc.Já a inconstitucionalidade material é a produção de atos
legislativos ou normativos que desrespeitem o próprio conteúdo das
normas constitucionais.
5.2. INCONSTITUCIONALIDADE POR OMISSÃO
É
a não-elaboração de atos legislativos ou normativos que impossibilitem o
cumprimento de preceitos constitucionais. É uma inovação da
Constituição portuguesa de 1976, que foi adaptada, pelo constituinte de
1988 à atual Lei Maior. Sempre que um preceito constitucional não puder
ser cumprido por inércia legislativa ou administrativa dos poderes
constituídos estaremos diante de uma inconstitucionalidade por omissão.
Exemplo: participação dos trabalhadores na gestão da empresa, "conforme
definido em lei" (CF, art. 7°, XI). Enquanto esse direito não for
passível de cumprimento por falta de legislação regulamentadora,
existirá uma inconstitucionalidade por omissão. Duas novas ações foram
introduzidas pela Constituição de 1988 para solucionar a inércia
legislativa ou administrativa: a ação de inconstitucionalidade por
omissão (art. 103, § 2º) e o mandado de injunção (art. 5º, LXXI), com
pressupostos e efeitos diferentes. Essas novas ações serão estudadas em
capítulos próprios.
6. FORMAS DE CONTROLE
O controle da
constitucionalidade pode ser exercido em dois momentos, antes e depois
da aprovação do ato legislativo ou normativo. São as duas formas de
controle: preventivo e repressivo.
a) Controle preventivo. Feito a
priori, antes da elaboração da lei, impede que um projeto de lei
inconstitucional venha a ser promulgado. Como o controle preventivo é
realizado antes da aprovação da lei, incide sobre o projeto de lei. É
exercido pelos Poderes Legislativo e Executivo. O Legislativo executa
esse controle pelas Comissões (CF, art. 58). Toda Casa legislativa
possui uma Comissão de Constituição e Justiça, ou órgão semelhante, que
tem como função primordial justamente a verificação da
constitucionalidade do projeto de lei apresentado para aprovação. O
Poder Executivo exerce essa forma de controle pelo veto do Presidente da
República ao projeto de lei aprovado pelo Legislativo (CF, art. 6, §
1°).
b) Controle repressivo, sucessivo ou "a posteriori". E
realizado após a elaboração da lei ou do ato normativo. Sua finalidade é
retirar uma lei ou ato normativo. Sua finalidade é retirar uma lei ou
ato normativo inconstitucional da esfera jurídica. Essa forma de
controle é exercida nos países que adotaram o sistema constitucional
norteamericano pelo Poder Judiciário. No Brasil, o Poder Judiciário
exerce o controle repressivo da constitucionalidade mediante dois
sistemas, em abstrato e em concreto, que serão examinados no item 13.
Excepcionalmente, como veremos no item 12, em duas hipóteses, a
Constituição admite o controle realizado após a edição da lei ou do ato
normativo pelo Poder Legislativo.
7. ÓRGÃOS DE CONTROLE
O controle da constitucionalidade pode ser exercido por diversos órgãos, pertencentes ou não ao Poder Judiciário.
a)Político:
O controle político da constitucionalidade é exercido por órgão não
pertencente ao Poder Judiciário. Exemplos: na França, ele é feito pelo
Conselho Constitucional e, na extinta URSS, era exercido pelo
[Presidium] do Soviete Supremo.
b)Judicial ou judiciário: O
controle judicial da constitucionalidade é exercido pelos integrantes do
Poder Judiciário. A verificação da adequação vertical, da
correspondência entre atos legislativos e a Constituição, é Feita pelos
,juízes e tribunais. Exemplos: Brasil e Estados Unidos. Esse controle
pode ser feito pelos critérios difuso ou concentrado.
8. CRITÉRIOS
DE CONTROLE a) Difuso: O controle da constitucionalidade é exercido por
todos os integrantes do Poder Judiciário. Qualquer juiz ou tribunal
pode declarar a inconstitucionalidade da lei no caso em exame (Estados
Unidos).
b) Concentrado: O controle só é exercido por um Tribunal
Superior do país ou por uma Corte Constitucional (Alemanha). O Brasil
adota os dois critérios: o difuso no controle em concreto e o
concentrado no controle em abstrato. Essas formas de controle serão
examinadas no item 13.
9. MEIOS DE CONTROLE a)Incidental ou via de
defesa: O objeto da ação é a satisfação de um direito individual ou
coletivo. sendo alegada de forma incidental a ofensa do ato legislativo
ou normativo ao Texto Constitucional.
b) Principal ou via de ação: O objeto da ação é a própria declaração da inconstitucionalidade do ato legislativo ou normativo.
10.
EFEITOS DA DECISÃO a) ["Inter partes"]: A decisão produz efeitos
somente entre as partes, para as pessoas que participaram da relação
processual. É uma conseqüência da via de defesa. b) ["Erga omnes"]: A
decisão produz efeitos para todos. É uma conseqüência da via de ação.
1.
NATUREZA DA DECISÃO a)["Ex tunc"]: A decisão que declara a
inconstitucionalidade de uma lei ou ato normativo é retroativa,
alcançando a lei e todas as suas conseqüências jurídicas desde a sua
origem.
b) ["Ex nunc"]: A decisão que declara a
inconstitucionalidade de uma lei ou ato normativo não é retroativa,
produzindo efeitos a partir da sua publicação.
12. CONTROLE DA CONSTITUCIONALIDADE NO BRASIL
No
Brasil o controle da constitucionalidade é exercido por todos os
poderes constituídos, que têm o dever de zelar pelo respeito à
Constituição. O controle preventivo é exercido pelos Poderes Legislativo
e Executivo, que impedem que um projeto de ato legislativo
inconstitucional venha a ser aprovado. O Poder Legislativo realiza O
controle pela Comissão de Constituição e Justiça existente em toda Casa
Legislativa, que examina o projeto de ato legislativo sob esse aspecto
antes da votação em Plenário (CF, art. 58). O Poder Executivo exerce
essa forma de controle pelo poder de veto jurídico do Presidente da
República ao projeto de lei aprovado pelo Congresso Nacional (CF art. 6,
§ 1°).De forma extraordinária, o Supremo Tribunal Federal tem admitido,
somente por parte de parlamentares, o exercício de um controle
jurisdicional preventivo da constitucionalidade. É assegurado aos
membros do Poder Legislativo o direito público subjetivo à correta
formação de espécies normativas, impedindo a tramitação de emendas
constitucionais e leis que incidam em vícios constitucionais. Por
exemplo, é possível a concessão de um mandado de segurança contra ato do
Presidente de uma Casa Legislativa que admita a tramitação de uma
proposta de emenda constitucional que pretenda a supressão de uma
cláusula pétrea (RTJ, 9:1.031 e Informativo STF, n. 239). Em relação às
demais pessoas, em respeito ao princípio constitucional da separação de
poderes, não se admite o ingresso em juízo para se questionar a
constitucionalidade de projeto de atolegislativo, havendo a necessidade
de se aguardar eventual aprovação e promulgação.O controle repressivo é
feito pelo Poder Judiciário. Caso o projeto de lei que contenha alguma
inconstitucionalidade venha a ser aprovado pelo Legislativo e sancionado
pelo Executivo, a lei poderá ter seu vício declarado pelo Poder
Judiciário.
O controle repressivo é exercido por duas vias, tanto
de forma absoluta, pela via principal ou de ação, como de forma
concreta, pela via de exceção ou incidental. A Constituição Federal, de
forma excepcional, em duas hipóteses, admite que o controle repressivo
da constitucionalidade seja exercido pelo Poder Legislativo, com a
finalidade de retirar do ordenamento jurídico normas já editadas, com
plena vigência e eficácia:
1ª) decreto legislativo do Congresso
Nacional visando sustar atos normativos do Poder Executivo que exorbitem
do poder regulamentar (CF, art. 84, IV, segunda parte) ou dos limites
da delegação legislativa (CF, art. 68, § 2°), conforme o disposto no
art. 49, V;
2ª) medidas provisórias rejeitadas pelo Congresso
Nacional por apresentarem vício de constitucionalidade, por não
atenderem aos pressupostos constitucionais de relevância e urgência (CF,
art. 62, § 5°).
13. DOIS SISTEMAS DE CONTROLE DA CONSTITUCIONALIDADE: EM ABSTRATO E EM CONCRETO
Existem
dois sistemas de se verificar a constitucionalidade de um ato
legislativo ou normativo federal ou estadual em relação à Constituição
Federal: em abstrato ou em concreto. No primeiro, o objeto da decisão
judicial é a própria constitucionalidade da norma impugnada. No segundo,
a satisfação dedireito individual ou coletivo, sendo a questão da
constitucionalidade argüida de forma incidental. No Brasil, esses dois
sistemas convivem de forma harmoniosa, com as particularidades a seguir
destacadas. Controle em abstrato ou direto da constitucionalidade ou via
principal ou de ação ou concentrado: Conforme entendimento adotado pela
nossa Suprema Corte, o controle abstrato da constitucionalidade é
processo de natureza objetiva, em que é questionada a própria
constitucionalidade ou não de uma lei, não se admitindo a discussão de
situações de interesses meramente individuais. Essa forma de controle
apresenta as características a seguir enunciadas.
a) O objeto da
ação é a própria declaração da inconstitucionalidade ou
constitucionalidade do ato legislativo ou normativo (via principal ou de
ação).
b) A ação deve ser proposta diretamente perante o Supremo Tribunal Federal (controle concentrado).
c)
A decisão tem efeito erga omnes (vale para todos, produzindo coisa
julgada mesmo para as pessoas e órgãos que não participaram da ação).
Por se tratar de um processo de natureza objetiva, entidades privadas
não podem participar no pólo passivo do processo de ação direta de
inconstitucionalidade, mesmo que sejam atingidas pelos efeitos da
decisão (STF, ADIn 1.254, Rel. Min. Celso de Mello, DJ, 19 set. 1997, p.
45530). Essa vedação, da intervenção de terceiros no processo de ação
direta de inconstitucionalidade, contida expressamente na Lei n.
9.868/9, em seu art. 7°, caput, foi abrandada pela introdução em nosso
direito positivo da figura do [amicus curiae], cuja função será
examinada no item 18 deste capítulo.
d) A ação só pode ser
proposta pelos órgãos e pessoas mencionadas no art. 1O3 da Constituição
Federal (titularidade). Esse rol já foi devidamente ampliado pela Carta
de 1988, pois antes só era reconhecida a legitimidade do
Procurador-Geral da República para a propositura dessa forma de controle
de constitucionalidade.
e) Declarada a inconstitucionalidade, a lei torna-se imediatamente inaplicável.
Controle em concreto ou indireto da constitucionalidade ou via de defesa ou de exceção ou difuso ou aberto.
a) O objeto da ação é a satisfação de um direito individual ou
coletivo. A inconstitucionalidade do ato legislativo ou normativo é
argüida incidentalmente [incidentur tantum] por qualquer uma (das
partes, autor ou réu (via incidental ou de defesa). Pelo autor, pode ser
argüida em sede de mandado de segurança,habeas corpus ou qualquer outra
ação. Pelo réu, em sua defesa judicial.
b) A questão pode ser
argüida perante qualquer juiz ou tribunal (controle difuso). Dessa
forma, pela via difusa, há possibilidade de decisões conflitantes,
conforme o entendimento de cada órgão judicial.
c) A decisão produz efeitos inter partes. Só vincula e produz coisa julgada para as partes da relação processual.
d) A questão só pode ser argüida pelo titular do direito individual ou coletivo.
e)
Declarada a inconstitucionalidade pelo Supremo Tribunal Federal, em
sede de recurso extraordinário eventualmente interposto (CF, art. 102,
I, a), há necessidade da comunicação ao Senado Federal, para que esta
Casa Legislativa providencie a suspensão da executoriedade da lei ou ato
normativo declarado inconstitucional pelo órgão de cúpula do Poder
Judiciário no Brasil (CF, art. 52, X).
14. MODALIDADES DE AÇÃO DIRETA
No
direito constitucional positivo brasileiro existem cinco modalidades de
controle em abstrato ou direto da constitucionalidade:
a) ação
direta de inconstitucionalidade; ADIn b) ação declaratória de
constitucionalidade; ADC c) ação de inconstitucionalidade por omissão;
ADIN por omissão d) representação interventiva; e) argüição de
descumprimento de preceito fundamental. ADPF
14.1. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE (ADIn)
(CF,ART.
102, I, "A", PRIMEIRA PARTE) A ação direta de inconstitucionalidade
visa a declaração de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo
federal ou estadual perante a Constituição Federal. Trata-se de ação de
competência originária do Supremo Tribunal Federal. Seu procedimento
está estabelecido na Lei n. 9.868/9. Tratando-se de argüição de
inconstitucionalidade de lei estadual ou municipal perante a
Constituição Estadual, a competência originária será dos Tribunais de
Justiça de cada Estado (CF, art. 125, § 2°).
14.2. AÇÃO DECLARATÓRIA DE CONSTITUCIONALIDADE (ADC) (CF, ART. 102, I, "A", SEGUNDA PARTE
Trata-se
de nova forma de controle em abstrato da constitucionalidade
introduzida pela Emenda Constitucional n. 3, de 1993. Essa ação visa a
declaração da constitucionalidade de uma lei ou alo normativo federal. A
finalidade dessa modalidade de ação foi dar ao governo a oportunidade
de obter uma rápida decisão judicial definitiva do Supremo Tribunal
Federal que produzisse efeitos erga omnes, evitando decisões contrárias
em instâncias inferiores e o não-cumprimento da medida legislativa
adotada. Para a propositura dessa ação é indispensável a demonstração da
existência de séria divergência jurisprudencial que justifique o uso
dessa forma de controle direto da constitucionalidade. Conforme já
decidiu o Supremo Tribunal Federal, há "necessidade de que esse dissídio
se exteriorize em proporções relevantes, pela ocorrência de decisões
antagônicas, que, em ambos os sentidos e em volume expressivo, consagrem
teses conflitantes" (STF, ADC 8-DF, Rel. Min. Celso de Mello,
Informativo STF, n. 160). O Supremo não pode ser transformado em um
simples órgão de consulta sobre a constitucionalidade de uma lei antes
da comprovação de um sério dissídio judicial. O procedimento da ação
declaratória de constitucionalidade está estabelecido na Lei n. 9.868/9.
14.3. AÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE POR OMISSÃO (CF,ART. 103, § 2º)
Constituição, em seu art. 7°, IV: "salário mínimo, fixado em lei |
Nova
forma de controle de constitucionalidade, introduzida pela Constituição
de 1988. O objeto da ação é suprir a omissão dos poderes constituídos,
que deixaram de elaborar a norma regulamentadora que possibilita o
exercício de um direito previsto na Constituição. Estabelece o art. 103,
§ 2º, que, "declarada a inconstitucionalidade por omissão de medida
para tornar efetiva norma constitucional, será dada ciência ao Poder
competente para a adoção das providências necessárias e, em se tratando
de órgão administrativo, para fazê-lo em trinta dias". Tratando-se de
omissão administrativa, o órgão competente será cientificado para
providenciar a norma regulamentadora faltante no prazo de trinta dias.
No caso de omissão legislativa, simplesmente o Congresso Nacional será
comunicado da mora, sem a estipulação de qualquer prazo para a
elaboração da indispensável norma infraconstitucional para o exercício
do direito previsto na Constituição não auto-aplicável. A omissão pode
ser total, quando há falta da norma regulamentadora que possibilite o
exercício do direito, ou parcial, se aquela não permitir o integral
cumprimento do direito previsto na Constituição Federal. Exemplo de
omissão total: o direito à participação dos trabalhadores na gestão da
empresa, "conforme definido em lei", estabelecido no art. 7°, XI, da
Constituição, até hoje não pode ser exercido por falta de legislação
regulamentadora. Exemplo de omissão parcial: o salário mínimo, pelo seu
atual valor irrisório, não atende às exigências estabelecidas na capaz
de atender a suas necessidades vitais básicas e às de sua família com
moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene,
transporte e previdência social...". A decisão proferida em sede de ação
de inconstitucionalidade por omissão só possui caráter mandamental
quando se tratar de omissão meramente administrativa, hipótese em que «
órgão responsável deverá providenciar a edição da medida faltante no
prazo máximo de trinta dias, sob pena de incidir na prática do crime de
desobediência. Tratando-se de inércia total ou de atuação normativa
deficiente de qualquer um dos poderes constituídos, Executivo,
Legislativo ou Judiciário, nossa Suprema Corte não pode se substituir ao
órgão estatal moroso, providenciando, por si só, a edição do provimento
normativo faltante. Sua decisão tem caráter de mera admoestação, de
comunicação do nãocumprimento do preceito constitucional.
14.4. REPRESENTAÇÃO INTERVENTIVA (CF, ART. 129, IV)
Além
da declaração da inconstitucionalidade, essa ação visa o
restabelecimento da ordem constitucional no Estado ou no Município.
Existem duas modalidades de ação interventiva: federal e estadual. A
primeira busca promover a intervenção da União nos Estados (arts. 34,
36, I e 129, IV), enquanto a estadual, a intervenção dos Estados nos
Municípios. A intervenção federal é de competência originária do Supremo
Tribunal Federal e a estadual, dos Tribunais de Justiça.
14.5. ARGÜIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL (ADPF)
A
Constituição, em seu art. 102, § 1º, estabeleceu uma nova forma de
controle concentrado da constitucionalidade. Compete ao Supremo Tribunal
Federal apreciar e julgar argüição de descumprimento de preceito
fundamental. Essa ação constitucional, prevista em norma de eficácia
limitada, veio a ser regulamentada somente pela Lei n. 9.882/9. Dada a
previsão da incidência do princípio da subsidiariedade, essa ação
constitucional não será admitida "quando houver qualquer outro meio
eficaz de sanar a lesividade" (Lei n. 9.882/9, art. 4°, § 1°). Poderá
ser proposta quando não for cabível ação direta de
inconstitucionalidade, ação declaratória de constitucionalidade, mandado
de segurança, ação popular, agravo regimental, recurso extraordinário,
reclamação ou qualquer outra medida judicial apta a sanar, de maneira
eficaz, a situação de lesividade, conforme reiteradas decisões do
Supremo Tribunal Federal (Informativo STF, n. 243). Foi concedida
legitimidade ativa para as mesmas pessoas e órgãos previstos no rol
estabelecido no art. 103 da Constituição Federal. Aos demais
interessados é facultado solicitar, mediante representação, ao
Procurador-Geral da República a propositura dessa argüição.
A ação pode ser proposta para:
a)
evitar ou reparar lesão a preceito fundamental decorrente de ato ou
omissão do Poder Público; e b) quando for relevante o fundamento da
controvérsia constitucional sobre lei ou ato normativo federal, estadual
ou municipal, incluídos os anteriores à Constituição. Esse segundo
objeto estende o alcance do controle da constitucionalidade para as leis
municipais e para as elaboradas antes da vigência da atual
Constituição, o que contraria a orientação jurisprudencial deixada pelo
Supremo Tribunal Federal. A decisão proferida possui eficácia erga omnes
e efeito vinculante em relação ao Poder Público. Foi atribuída à
Suprema Corte, tendo em vista razões de segurança jurídica ou de
excepcional interesse social, a possibilidade de estabelecer, por
maioria de 2/3, que a declaração de inconstitucionalidade da lei ou do
ato normativo só tenha eficácia a partir do trânsito em julgado ou de
qualquer outro momento que venha a ser fixado.
15. CONCEITO DE LEI E ATO NORMATIVO PARA EFEITO DE CONTROLE EM ABSTRATO DA CONSTITUCIONALIDADE
A
Constituição Federal estabelece, em seu art. 102, I, a, que poderá ser
declarada a inconstitucionalidade de qualquer lei ou ato normativo
federal ou estadual. Entende-se que o vocábulo lei foi empregado em
sentido amplo, admitindo-se a verificação da adequação constitucional em
relação a qualquer modalidade de ato legislativo prevista no art. 59:
emendas à Constituição, leis ordinárias, leis complementares, medidas
provisórias, decretos legislativos e resoluções. Qualquer espécie de ato
legislativo pode ser objeto do controle direto da constitucionalidade,
desde que seja de caráter geral e abstrato. Atos legislativos de efeitos
concretos, com destinatários certos, não são suscetíveis dessa forma de
controle. O conceito de ato normativo abrange todos os atos expedidos
pelos poderes constituídos, contendo regras gerais e abstratas que não
estejam inseridas no conceito de lei empregado pela Constituição.
Alcança, entre outras medidas. decretos do Poder Executivo, instruções
normativas da Secretaria da Receita Federal, normas regimentais de
tribunais federais e estaduais, decisões normativas do Conselho Superior
da Magistratura ou do Conselho Superior do Ministério Público.
16. CONCESSÃO DE MEDIDA CAUTELAR NO CONTROLE EM ABSTRATO DA CONSTITUCIONALIDADE
A
Constituição Federal admite expressamente a concessão de cautelar nas
ações diretas de inconstitucionalidade (art. 102, I, p). O Supremo
Tribunal Federal já decidiu que é possível também, mesmo sem previsão
constitucional expressa, dentro do poder geral de cautela do Poder
Judiciário, a concessão de medida cautelar em ações declaratórias de
constitucionalidade. A Lei n. 9.868/9, que dispõe sobre essas
modalidades de ação, admite n concessão de medida cautelar pela maioria
absoluta dos membros do tribunal, após audiência dos órgãos ou
autoridades dos quais emanou a lei ou ato normativo, salvo no período de
recesso ou de excepcional urgência.
17. PRINCÍPIO DA RESERVA DE PLENÁRIO
Pelo
princípio da reserva de Plenário, os tribunais somente poderão declarar
a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público pelo
voto da maioria absoluta de seus membros ou dos membros do respectivo
Órgão Especial (CF, art. 97). Trata-se de uma cautela introduzida na
Constituição brasileira de 1934 e reiterada em todas as seguintes. A
declaração de inconstitucionalidade de uma lei ou de um ato normativo,
quer no controle em abstrato, quer no controle em concreto da
constitucionalidade, dada a sua relevância, não pode variar de acordo
com a composição da Turma julgadora, nem estar sujeita a maiorias
ocasionais. Tendo sido argüida a inconstitucionalidade de uma lei
perante órgão fracionário do tribunal (Câmaras, Grupos, Turmas ou
Seções), a questão constitucional deverá ser examinada pelo Plenário do
tribunal ou pelo respectivo Órgão Especial. Competirá ao órgão
fracionário do tribunal, em acolhendo a alegação, submeter a
controvérsia jurídica ao Tribunal Pleno (STF, R7J, 150:223-4). Contudo,
acompanhando a evolução jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal, foi
acrescentado um parágrafo único ao art. 481 do Código de Processo
Civil, que recebeu a seguinte redação: "Os órgãos fracionários dos
tribunais não submeterão ao plenário, ou ao órgão especial, a argüição
de inconstitucionalidade, quando já houver pronunciamento destes ou do
plenário do Supremo Tribunal Federal sobre a questão".
18. FUNÇÃO
DO PROCURADOR-GERAL DA REPÚBLICA, DO ADVOGADO-GERAL DA UNIÃO E DO AMICUS
CURIAE NO CONTROLE EM ABSTRATO DA CONSTITUCIONALIDADE a) O
Procurador-Geral da República é sempre ouvido nos processos de controle
de constitucionalidade. Sua função é de custos legis, de defesa da ordem
jurídica, mesmo quando é o autor da ação, podendo opinar pela sua
procedência ou não (CF, art. 103, § 1º).
b) O Advogado-Geral da União exerce a função de defensor da lei
(defensor
legis) ou do ato normativo federal ou estadual impugnado na ação direta
de inconstitucionalidade, velando pela presunção de constitucionalidade
das normas infraconstitucionais elaboradas pelo Poder Público (CF, art.
103, § 3°). Não poderá sustentar posição contrária ao ato impugnado
(STF, ADIn 1.254-1, Rel. Min. Celso de Mello, DJU, 10 set. 1997). Deverá
ser intimado para, no prazo de quinze dias, apresentar a defesa do ato
impugnado (Lei n. 9.868/9, art. 8º).
c) Um novo personagem
processual foi introduzido no controle de constitucionalidade em nosso
ordenamento jurídico. Trata-se do denominado amicus curiae, previsto na
Lei n. 9.868/9, atuando nos dois sistemas de controle de
constitucionalidade, em abstrato e em concreto. Na ação direta de
inconstitucionalidade, por se tratar de um processo de natureza
objetiva, em que não são examinados direitos individuais, é vedada
expressamente a intervenção de terceiros. Esse rigor é atenuado pelo
disposto no art. 7°, § 2°, da mencionada legislação, ao admitir a
intervenção de outros órgãos ou entidades, por despacho do relator,
atendendo os pressupostos de relevância da matéria e da
representatividade adequada dos postulantes. Como observou o Ministro
Celso de Mello, trata-se de um fator de legitimação social das decisões
da Suprema Corte, e tem por finalidade pluralizar o debate
constitucional, ao possibilitar a "participação formal de órgãos ou
entidades que efetivamente representem os interesses gerais da
coletividade ou que expressem valores essenciais de grupos ou classes
sociais" (ADIn-MC-2.130/SC). Dispositivo semelhante foi incluído no
controle de constitucionalidade em concreto, durante a tramitação do
incidente de declaração de inconstitucionalidade (Código de Processo
Civil, art. 482, § 3°).
19. CONTROLE DA CONSTITUCIONALIDADE DE LEIS MUNICIPAIS
A
atual Constituição, em seu art. 102, I, a, admite o controle em
abstrato ou direto somente de leis ou atos normativos federais ou
estaduais. Em razão da ausência de previsão constitucional expressa, o
Supremo Tribunal Federal não conhece de ações diretas de
inconstitucionalidade de leis municipais perante a Constituição Federal,
em razão da impossibilidade, jurídica do pedido (STF, ADIn 1.803-0-SP
Rel. Min. Moreira Alves, DJU, 24 abr. 1998, p. 4). Tratando-se de lei
municipal contrária à Constituição Federal, é possível apenas o controle
difuso da constitucionalidade, podendo a questão ser examinada pelo
Supremo somente pela via incidental, no julgamento de casos concretos,
produzindo efeitos inter partes. A lei municipal que contrariar a
Constituição Estadual poderá ser objeto de ação direta de
inconstitucionalidade perante o Tribunal de Justiça (CF, art. 125, §
2°). Reproduzindo a Constituição Estadual norma da Carta Federal de
observância obrigatória nos Estados, é possível a propositura de ação
direta de inconstitucionalidade de lei municipal, por afronta à
Constituição Estadual, perante o Tribunal de Justiça local, com
possibilidade de recurso extraordinário para o Supremo Tribunal Federal.
Tratando da argüição de descumprimento de preceito fundamental, a Lei
n. 9.882/9 expressamente admite o exame de controvérsia constitucional
fundada em lei municipal, alterando a jurisprudência constitucional do
Supremo Tribunal Federal.
20. COMUNICAÇÃO AO SENADO FEDERAL DA DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE
A
Constituição Federal, em seu art. 52, X, dispõe que compete
privativamente ao Senado "suspender a execução, no todo ou em parte, de
lei declarada inconstitucional por decisão definitiva do Supremo
Tribunal Federal". Duas controvérsias surgiram sobre o alcance desse
dispositivo, ambas já solucionadas pela jurisprudência constitucional
brasileira. 1ª) O Supremo Tribunal Federal estabeleceu que somente nos
processos de controle em concreto da constitucionalidade, em que a
declaração de inconstitucionalidade de uma lei é proferida de forma
incidental (incidentur tantum), com efeito inter partes, há necessidade
de comunicação da decisão do Senado, para que este órgão providencie a
suspensão da executoriedade da lei. Transitado em julgado, a decisão no
caso concreto produz efeitos ex tunc e inter partes, ou seja,
retroativos e alcançando apenas as partes da relação processual. Assim
que publicada a resolução do Senado Federal, é suspensa a executoriedade
da lei, com a extensão dos efeitos ex nunc e erga omnes, ou seja, a
decisão passa a valer para todos, sem possuir efeitos retroativos. A
resolução do Senado não invalida, nem revoga a lei declarada
inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal, apenas lhe retira a
eficácia jurídica, produzindo efeitos em relação a todos a partir
daquela data. Nas decisões proferidas no controle direto ou em abstrato
da constitucionalidade já não há necessidade dessa comunicação, pois o
v. aresto assim que publicado produz efeitos erga omnes, dispensando a
comunicação ao Senado Federal para que providencie a suspensão da
executoriedade da lei. 2ª) O Senado Federal não é obrigado a suspender a
executoriedade da lei assim que recebe a comunicação da decisão
definitiva proferida pela via incidental. Os Poderes Judiciário e
Legislativo são independentes. A decisão do Supremo Tribunal Federal não
vincula o Senado, que age com absoluta discricionariedade. podendo
optar pela suspensão imediata ou aguardar por outras decisões proferidas
no mesmo sentido. Michel Temer entende que o Senado poderá, inclusive,
retirar parcialmente a eficácia de uma lei que o Supremo Tribunal
Federal tenha declarado, em seu todo, inconstitucional. O Senado age com
absoluta discricionariedade, conforme lhe assegura o art. 52, X, ao
possibilitar a suspensão parcial ou total da lei.
21. TITULARIDADE
Antes
da Constituição de 1988 somente o Procurador-Geral da República possuía
legitimidade para a propositura de ação direta de
inconstitucionalidade. Como exercia o cargo por deliberação do
Presidente da República, sendo demissível ad nutum, não agia com
absoluta independência, deixando de propor diversas ações reclamadas
pela sociedade civil. Como a atual Constituição foi concebida cm um
momento de aspiração democrática da sociedade brasileira, ampliou-se o
rol das pessoas legitimadas para a propositura de tal ação, bem como se
conferiu mandato ao Procurador-Geral da República. Hoje, de acordo com o
art. 103 da Constituição Federal, podem propor a ação direta de
inconstitucionalidade: o Presidente da. República, as Mesas do ,Senado
Federal, da Câmara dos Deputados e das Assembléias Legislativas, os
Governadores
de Estado, o Procurador-Geral da República, o Conselho Federal da Ordem
dos Advogados do Brasil, partido político com representação no
Congresso Nacional e confederação sindical ou entidade de classe de
âmbito nacional. Esse elenco é taxativo, lendo sido interpretado de
forma extremamente restritiva pelo Supremo Tribunal Federal. Dentro
dessa concepção restritiva, o Supremo entende que não possuem
legitimidade ativa para a propositura de ação direta de
inconstitucionalidade diversas entidades, tais como Mesas de Câmaras
Municipais, sindicatos, centrais de trabalhadores, federações,
associação de associações e a União Nacional de Estudantes. Para a
propositura da ação declaratória de constitucionalidade, incluída no
Texto Constitucional pela Emenda n. 3, de 1993, foi previsto um rol mais
restrito de pessoas e órgãos legitimados: o Presidente da República, as
Mesas do Senado Federal e da Câmara dos Deputados e o Procurador-Geral
da República (CF, art. 103, § 4°). A Lei n. 9.869/9, que dispõe sobre o
controle em abstrato da constitucionalidade, em seu art. 2°, em uma
interpretação extensiva do art. 103 da Constituição Federal, estende a
legitimidade ativa para a propositura da ação direta para a Mesa da
Câmara Legislativa do Distrito Federal e para o Governador da mesma
entidade federativa. O Distrito Federal acumula as competências
legislativas reservadas aos Estados e Municípios (CF, art. 32, § 1º). A
jurisprudência constitucional do Supremo Tribunal Federal já aceitava o
controle em abstrato de leis distritais que ferissem a Constituição
Federal, desde que editadas em matéria de competência legislativa
estadual.
2. PERTINÊNCIA TEMÁTICA
Pertinência temática é a
relação existente entre a norma impugnada e a entidade que ingressa com a
ação direta de inconstitucionalidade. O Supremo Tribunal Federal tem
exigido de algumas das pessoas e dos órgãos relacionados no art. 103 da
Constituição Federal a demonstração de um especial interesse em obter
decisão de declaração da inconstitucionalidade da norma impugnada. Em
relação a esses autores a demonstração da pertinência temática, como
reiteradamente vem decidindo o Supremo Tribunal Federal, é pressuposto
da legitimidade ativa para a ação direta de inconstitucionalidade (ADIn
1.151, RTJ, 158:790,ADIn 1.519, DJ, 13 dez. 1996, e ADIn 2.027-7, Rel.
Min. Octavio Gallotti, DJ, 13 set. 1999, p. 2). São considerados autores
interessados ou especiais, que precisam demonstrar a denominada
pertinência temática, as Mesas das Assembléias Legislativas, os
Governadores de Estado e as confederações sindicais ou entidades de
classe de âmbito nacional. São tidos como autores neutros ou universais,
pois não precisam demonstrar especial interesse na declaração da
inconstitucionalidade da lei ou do ato normativo, o Presidente da
República, as Mesas do Senado Federal e da Câmara dos Deputados, o
Procurador-Geral da República, o Conselho Federal da Ordem dos Advogados
do Brasil e partido político com representação no Congresso Nacional.
23. NORMAS ELABORADAS ANTES DA VIGÊNCIA DA CONSTITUIÇÃO
Em
virtude da recepção somente das normas infraconstitucionais compatíveis
com a atual Constituição, não há possibilidade de controle em abstrato
ou direto da constitucionalidade de leis ou atos normativos elaborados
antes de sua entrada em vigor. De acordo com a jurisprudência
constitucional do Supremo Tribunal Federal, ou as normas
infraconstitucionais elaboradas na vigência da Carta anterior são
compatíveis com a nova ordem constitucional e, portanto, recepcionadas
pela Constituição em vigor, ou são incompatíveis e foram revogadas com
sua promulgação. O exame judicial da vigência ou não dessas normas
infraconstitucionais poderá ser feito somente pela via difusa, no
julgamento do caso concreto.Pela mesma razão, tendo sido aprovada uma
nova emenda à Constituição, eventual incompatibilidade entre uma lei e a
norma constitucional superveniente não pode ser objeto de controle
direto da constitucionalidade. A questão da revogação ou não da lei pela
emenda constitucional superveniente poderá ser examinada somente pela
via difusa (STF, ADIn 718-1, DJU, 18 dez. 1998, p. 49).Contudo,
tratando-se de argüição de descumprimento de preceito fundamental, a Lei
n. 9.882/9, em importante inovação, veio expressamente a admitir a
propositura de ação por fundamento em controvérsia constitucional sobre
lei anterior à Constituição.
24. NORMAS CONSTITUCIONAIS INCONSTITUCIONAIS
Há
autores que sustentam a possibilidade da existência de normas
constitucionais inconstitucionais, com fundamento na doutrina do autor
alemão Otto Bachoff. As normas constitucionais que fossem incompatíveis
com os princípios constitucionais fundamentais que formariam uma
Constituição jurídica universal, mesmo não incluídas na Lei Máxima do
Estado, poderiam ser declaradas inconstitucionais. Considerando,
contudo, a natureza absoluta do poder constituinte originário, somente
se deve admitir a possibilidade de normas constitucionais
inconstitucionais quando emanadas do poder constituinte derivado. As
elaboradas pelo poder constituinte originário são todas da mesma
hierarquia, não havendo a possibilidade de revogação de umas pelas
outras. Eventuais conflitos de normas são todos aparentes, devendo ser
resolvidos pelos princípios gerais de hermenêutica. Apenas normas
elaboradas pelo poder constituinte derivado em desconformidade com as
denominadas cláusulas pétreas da Lei Fundamental podem ser
inconstitucionais. Como salientado por Alexandre de Moraes, "não haverá
possibilidade de declaração de normas constitucionais originárias como
inconstitucionais".Somente em relação a normas constitucionais
elaboradas pelo poder constituinte derivado há possibilidade de ser
reconhecida eventual inconstitucionalidade. Assim já decidiu o Supremo
Tribunal Federal no julgamento da ADIn 939- DF, ao impedir a cobrança do
IPMF (Imposto Provisório sobre Movimentação Financeira), instituído
pela Emenda n. 3, de 1993, no mesmo exercício de sua criação, em
respeito ao princípio constitucional da anterioridade, um dos direitos
individuais considerados como imutáveis pela atual Constituição
brasileira (arts. 60, § 4°, IV, e 151, I, b).
25. ESPÉCIES DE DECISÕES PROFERIDAS NO CONTROLE EM ABSTRATO DA CONSTITUCIONALIDADE
Ao
julgar uma ação direta de inconstitucionalidade ou uma ação
declaratória de constitucionalidade, o Supremo Tribunal Federal deverá
decidir pela constitucionalidade ou não do ato legislativo ou normativo
federal ou estadual. Qualquer que seja a decisão, pela procedência ou
não da ação, produzirá efeitos erga omnes e vinculantes. Uma lei em
desacordo com a Constituição, quer em sentido formal, quer material,
considerando o princípio da supremacia da norma constitucional, é nula,
sem qualquer efeito jurídico válido. Dessa forma, a decisão é
retroativa, produzindo, em regra, efeitos ex tunc.Diferentes declarações
de nulidade de lei, como aponta Gilmar Ferreira Mendes, podem ser
proclamadas pelo Supremo Tribunal Federal: a) nulidade total; b)
nulidade parcial; e c) declaração de nulidade sem redução de texto.
25.1. DECLARAÇÃO DE NULIDADE TOTAL
A
lei é declarada totalmente inconstitucional, o que ocorre
freqüentemente em leis aprovadas com vícios formais, como de iniciativa,
de procedimento legislativo ou de repartição de competência.
25.2. DECLARAÇÃO DE NULIDADE PARCIAL
Considerando
a possibilidade de divisibilidade da lei, é declarada a nulidade
somente dos dispositivos inconstitucionais, aproveitando-se os demais.
25.3. DECLARAÇÃO PARCIAL DE NULIDADE SEM REDUÇÃO DE TEXTO (LEI N. 9.868/9, ART. 28, PARÁGRAFO ÚNICO)
O Supremo Tribunal Federal limita-se a declarar a
inconstitucionalidade apenas de determinadas hipóteses de aplicação da
lei (p. ex., imposição de tributo no mesmo exercício financeiro e de
correção monetária a situações já consolidadas), reconhecendo a
possibilidade de aplicação da lei a outras hipóteses (imposição de
tributo no exercício financeiro seguinte ou de novos dispositivos legais
sem violação de direitos adquiridos, atos jurídicos perfeitos ou
decisões já transitadas em julgado).
25.4.INTERPRETAÇÃO CONFORME A CONSTITUIÇÃO (LEI N. 9.868/9, ART 28, PARÁGRAFO ÚNICO)
Em
outras decisões, o Supremo Tribunal Federal utiliza-se da interpretação
conforme a Constituição. Existindo duas ou mais interpretações
possíveis de uma lei, declara-se a validade do dispositivo legal,
indicando-se qual é compatível com a Constituição Federal e deve ser
adotada. Os limites da interpretação conforme a Lei Maior encontram-se
na vontade do legislador.A pretexto de se buscar o sentido da norma
constitucional, não se pode afrontar a manifesta intenção do legislador,
sob pena de violação do princípio da separação de poderes.
26. EFEITOS DA DECISÃO
Decisões
em ação direta de inconstitucionalidade e em ação declaratória de
constitucionalidade somente poderão ser tomadas por maioria absoluta de
votos, em observância ao princípio da reserva de Plenário inserido no
art. 97 da Constituição Federal. Em um colegiado de onze membros
vitalícios, exige-se o voto de pelo menos seis Ministros, em um sentido
ou no outro. O quorum para instalação da sessão de julgamento será de
pelo menos oito. Não alcançada a maioria necessária para proferir a
decisão, o julgamento será suspenso, aguardando-se o voto dos Ministros
ausentes, até que se obtenha a maioria absoluta. Decisões proferidas em
ações diretas de inconstitucionalidade e em ações declaratórias de
constitucionalidade são irrecorríveis, por emanarem da mais alta Corte
Judiciária do País, ressalvada somente a possibilidade de interposição
de embargos declaratórios. Não podem ser modificadas sequer em sede de
ação rescisória. Em regra essas decisões produzem efeitos ex tunc. Sendo
a lei inconstitucional nula, ela, em tese, não deve produzir nenhum
efeito jurídico. Mas o Supremo Tribunal Federal, tendo em vista razões
de segurança jurídica ou de excepcional interesse social, por 2/3 de
seus membros, pode estabelecer que a decisão produza efeitos ex nunc, a
partir do trânsito em julgado ou de outro momento que venha a ser
fixado. Em um colegiado de onze membros, 2/3 dos votos, feito o
arredondamento para mais, significam o voto de oito Ministros. Essa
mesma possibilidade de concessão de efeitos ex tunc ou ex nunc é
admitida na hipótese de concessão de medida cautelar. Os diversos
aspectos da decisão proferida no controle em abstrato da
constitucionalidade estão previstos na Lei n. 9.868/9.
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